ES: Sem renda de bicos, moradores de bairros pobres vivem epidemia da fome Nas periferias, isolamento e quarentena deixam sem dinheiro quem sobrevivia de trabalhos informais antes do coronavírus chegar. É o caso de Ester, que é ambulante mas está sem renda desde que o movimento nas ruas caiu por causa do coronavírus.
“Esses dias eu tive uma crise de choro na minha casa. Olhava para um lado e não tinha nada, do outro não tinha nada. Pedi a Deus para me ajudar”. O relato é da diarista Justina Maria Venâncio, 49 anos, moradora do bairro Resistência, em Vitória. Por conta do isolamento social exigido por autoridades e cientistas para reduzir a propagação do coronavírus, ela ficou sem trabalho e a família, sem a única fonte de renda da casa.
Justina mora com o filho e a sobrinha, ambos adolescentes. No andar de baixo, vive ainda a filha dela, Deizilane, de 23 anos, com os dois filhos, de 2 e 7 anos. Antes da pandemia de Covid-19 alterar a vida e a rotina de todos, ela trabalhava fazendo faxina em duas casas. “Ninguém quer que eu vá mais. Uma das casas é de dois idosos, falaram que é muito arriscado. Não tem mais faxina. Estou aqui, vivendo…”, diz. Há dias, a família já não tem dinheiro para comprar o básico. A comida vem de cestas básicas entregues pelo Centro de Referência de Assistência Social (Cras) ou da ajuda de membros da igreja. “Sou da Metodista, quando eu preciso de algo, eles me ajudam. As minhas contas quem tem pago é meu irmão”, relata.
Em Jaguaré, a reportagem efetuou ligações para os telefones da Secretaria Municipal de Assistência Social, mas não foi atendida, devido o feriado de Tiradentes.
SOCORRO COM CESTAS BÁSICAS
Nas comunidades da Grande Vitória, são as cestas básicas que estão garantindo um mínimo para algumas famílias de autônomos que, sem renda por conta do coronavírus não conseguem mais comprar alimentos. Há recursos vindos das próprias prefeituras ou do governo estadual que destinaram, por exemplo,a comida da merenda escolar para as famílias dos alunos durante o período de suspensão das aulas. O socorro, infelizmente, não chega para todos.
Em Flexal 2, Cariacica, a ambulante Ester Tomé da Silva e os oito filhos ficaram com as panelas vazias por conta da queda de circulação de pessoas que a deixou sem renda. “Meu arroz acabou, meu feijão, as coisas acabaram dentro de casa. Muito difícil você abrir seu armário e não ter nenhum ovo, uma linguiça para dar de comer. Por causa dessa doença, não tem como trabalhar”
Essa rede de apoio tem atuado em vários locais e envolve vizinhos, igrejas e associações. “Aqui têm muitas pessoas com dificuldade. Estamos pedindo doação de comida”, afirma o presidente da associação de moradores de Resistência, Batista Venâncio da Silva.
CHIKUNGUNYA E CORONAVIRUS
Ele conta que a situação da população da região já estava preocupante por causa do aumento de casos de chikungunya desde o início do ano, mas afirma que piorou muito depois da chegada da Covid-19 no Estado. De acordo com a Prefeitura de Vitória, a maioria dos mais de 4 mil casos registrados desde janeiro estão na região da Grande São Pedro. “Nessa área, antes de começar coronavírus já tinha a chikungunya,que deixou muita gente sem conseguir trabalhar e que já estava precisando das cestas básicas”, relata.
No bairro Conquista, ainda na Capital, os vizinhos também se uniram para tentar socorrer aqueles que estão com mais dificuldades. “Ontem mesmo um rapaz passou aqui oferecendo cesta básica para mim. Não peguei. Falei para dar para a senhora que mora mais em cima. Ela tem mais filhos do que eu”, conta Mauriceia da Silva Jacob, 39 anos. Mauriceia da Silva Jacob, 39 anos, faz marmitas, mas viu as vendas despencarem com a crise Mauriceia da Silva Jacob, 39 anos, faz marmitas, mas viu as vendas despencarem com a crise. Crédito: Arquivo pessoal
ESPERANÇA NO BENEFÍCIO
Tanto Mauriceia quanto Justina têm direito ao auxílio financeiro emergencial de R$ 600, apelidado de “coronavoucher”. Elas se inscreveram no programa, mas o dinheiro ainda não chegou. O pedido de benefício está em análise ainda pela Dataprev, empresa do governo federal responsável por verificar os cadastros dos candidatos ao benefício. Além do tempo, que pode ser longo demais para essas famílias, muitas desconheciam o benefício ou não tinham acesso à internet para fazer o pedido. “Eu ouvi falar disso (do auxílio), mas pedi um dos meus filhos me cadastrar. Nem telefone eu tenho”, afirma Justina.
A filha dela, Deisilane, que recebe Bolsa-Família e também têm direito a auxílio diz que tentou fazer o cadastro da mãe, mas não conseguiu concluir logo nos primeiros dias de liberação do site. Mauriceia também relata ter dificuldade em entender e se informar sobre como receber o auxílio. “Eu sou MEI (microempreendedor individual), então não sei se tenho direito a receber alguma coisa agora. Estou aguardando a análise acabar para saber se vou receber”, diz. (Agazeta)