BR: Esse anúncio preocupante foi feito por especialistas daquele país a algum tempo atrás, conforme artigo publicado no Independent.ie. Em palestra recente na Embrapa Soja, o pesquisador britânico Bart Fraajie, da prestigiosa Rothamsted Research, repetiu esse alerta. E qual a razão para isso? Trata-se do desenvolvimento de resistência de fungos patogênicos, especialmente do agente causal da septoriose, principal doença do trigo na Irlanda, aos fungicidas disponíveis para o controle. O custo de produção já é igual à receita ou mesmo maior para 90% dos produtores, segundo o artigo, e, se continuar crescendo, logo todo o negócio do trigo será economicamente inviável naquele país.
E o que levou a isso? A falta de diversificação e rotação de culturas e o uso indiscriminado de fungicidas, aliado a condições climáticas favoráveis aos patógenos. Ou seja, a monocultura e a falta de adoção de manejo adequado.
E o que temos a ver com isso? Muito! A matriz produtiva de grãos brasileira está baseada em poucos produtos (basicamente, soja, milho, trigo e arroz). Além disso, alguns produtores defendem uma segunda safra de soja no ano, visando à produção de sementes próprias. Com isso, a “janela” de cultivo fica duplicada, assim como, a aplicação de fungicidas e outros produtos fitossanitários, aumentando em muito a probabilidade do aparecimento de resistência por parte dos patógenos. Simplificando os cálculos, um fungicida que poderia ter efeito por 10 anos passa a ter vida útil de apenas 5!!
Artigo recente dos colegas Amélio Dall’Agnol e Pedro Moreira chamou atenção para o fato de as receitas com as exportações do agronegócio da Holanda serem maiores que as do Brasil. Se considerarmos que o território holandês é 200 vezes menor que o brasileiro e que a população é quase 13 vezes menor, essa constatação parece quase inimaginável! Mas por que isso acontece? A Holanda tem uma das produções mais diversificadas do planeta e, também, de maior valor agregado. É grande produtora de frutas, flores (tulipas) e hortaliças, todas com produção intensiva e alta produtividade.
É claro que as condições ambientais e territoriais brasileiras são muito diferentes da Holanda e do resto da Europa. O sistema de produção intensiva utilizado naquele país talvez ainda não faça muito sentido no Brasil. Mas a questão da diversificação, sim, é urgente.
O problema da resistência dos patógenos aos agroquímicos é crescente em todo mundo. Isto porque os microrganismos têm gerações muito curtas, ou seja, se multiplicam rapidamente e aos milhões e, portanto, quanto mais gerações houver, maior será a probabilidade de aparecer um indivíduo resistente. E, uma vez ocorrido isso, esse indivíduo resistente, atuando como inóculo inicial, se multiplicará rapidamente e prevalecerá sobre os demais, se estiver submetido à ação dos mesmos princípios ativos dos agrotóxicos aplicados repetidamente. É semelhante ao que acontece com as superbactérias resistentes aos antibióticos, que são responsáveis pelas infecções hospitalares, cada vez mais comuns e mais difíceis de serem eliminadas.
Temos que voltar aos velhos, mas sempre atuais, conceitos de rotação de culturas e boas práticas de manejo, enquanto é tempo. Não devemos esperar que nosso sistema produtivo se torne tão caro a ponto de se tornar inviável, como está ocorrendo na Irlanda e em outros países da Europa. Temos que cuidar para não matar nossa “galinha dos ovos de ouro” ou seja, o pujante agronegócio brasileiro. A visão míope e focada apenas na busca do lucro imediato pode resultar no prejuízo irreparável de amanhã. (Canal Rural).